Comunicações
CEDA (Centro de Estudos Documentais do
Alentejo-Memória Colectiva do Séc. XX) - PRESERVAR
A MEMÓRIA E A IDENTIDADE NUMA PERSPECTIVA DE FUTURO
O CEDA é um projecto científico
(sem preconceitos académicos) aberto, plural e abrangente,
que tem actualmente cerca de 100 aderentes, e tem vindo a
ser um ponto de encontro em defesa da preservação
da memória do Povo Alentejano, com a participação
de cientistas, técnicos, académicos, em estreita
colaboração com os intervenientes anónimos
da História do Alentejo, aliando o conhecimento científico
com a experiência humana.
O CEDA foi apresentado publicamente na Casa
do Alentejo, há precisamente um ano, no dia 4 de Outubro
de 2000, numa sessão onde usaram da palavra os Profs.
António Borges Coelho, António Ventura, Cláudio
Torres, Moisés Espírito Santo, Urbano Tavares
Rodrigues, Salwa Castelo-Branco, o Dr. Constantino Piçarra,
Pedro Alves, eu próprio, que tive o prazer de presidir
à sessão, e também o prof. José
Chitas, em representação da Casa do Alentejo.
Este projecto surgiu da necessidade de conjugar
esforços no sentido de preservar a memória e
a identidade cultural alentejana numa batalha sem tréguas,
em oposição necessária e activa, face
ao branqueamento da nossa história assim como aos efeitos
nefastos da globalização. É em nome desta
cultura urbana global que se emanam providências cautelares
contra as festas ancestrais do povo de Barrancos e que se
quer transformar a nossa rica gastronomia (do Alentejo e do
país) num imenso fast-food, onde alegremente
se servem os hamburgers provenientes dos touros que hipocritamente
não querem que se mate em Barrancos.
Na Primavera de 2000, o João Honrado,
o Pedro Alves e eu próprio, em Entradas (Castro Verde)
depois de uma inauguração da Exposição
itinerante sobre a obra de José da Fonte Santa, onde
tinhamos degustado um saboroso prato regional na companhia
do anfitrião, Fernando Caeiros, depois de debater esta
questão, resolvemos avançar.
Ciente de que a memória de um povo
é uma das suas maiores riquezas, anteriormente tinhamos
proposto criar, inicialmente, em estreita colaboração
com a autarquia de Alcácer do Sal e nomeadamente com
o seu presidente, o engenheiro Rogério de Brito, um
centro de documentação e estudos do canto
de intervenção e do cante alentejano.
Naturalmente, quando lhe apresentámos o projecto do
CEDA , Rogério de Brito aderiu de imediato.
Este projecto foi apresentado informalmente,
numa fase inicial aos presidentes das associações
de municípios em 18 de Junho de 2000, através
do engenheiro Rogério de Brito e foi agendada e formalmente
discutido em reunião destes organismos em meados de
Julho, tendo recebido o apoio dos autarcas.
Propusemo-nos alargar o âmbito do trabalho
a realizar, a todo o século XX assim como a temáticas
mais vastas e diversificadas, decidindo, para esse fim, juntar
sinergias e com o dever de uma cidadania responsável
que deve ser apanágio do historiador, reclamando e
construíndo através do seu "ofício"
o Direito à Memória de todo um povo, avançar
com um projecto para o Alentejo em que propomos o estudo das
diversas lutas rurais, tanto no âmbito social, como
cultural e mental e dando certamente um ênfase especial
a essa experiência extraordinária nos campos
do Sul que terá sido a Reforma Agrária, bem
como aos acontecimentos historicamente anteriores, para os
quais ainda nos podemos socorrer da oralidade. Para este trabalho,
especialmente na recolha oral, contamos com o apoio de actores
decisivos nestes períodos, "Actores" nos
movimentos sociais, como o próprio João
Honrado e Domingos Carvalho, entre outros militantes
antifascistas durante várias décadas do Estado
Novo, assim como o próprio engenheiro Rogério
de Brito e o engenheiro António Murteira,
quadros superiores do Ministério da Agricultura durante
o período da Reforma Agrária.
Mas porque é indispensável
que o "métier" do cientista social seja feito
com seriedade e rigor, a proposta foi a de reunir investigadores
com experiência de "trabalho de campo" numa
perspectiva interdisplinar: História, Antropologia,
Etnologia, Sociologia, Etnomusicologia, Agronomia, Geografia,
Arqueologia e Arqueologia Industrial, Arquitectura, Linguística,
etc, equipa esta integrada por mestres, doutores e licenciados,
tendo-se para o efeito já tido de imediato a adesão
ao projecto de mais de uma dezena de investigadores, licenciados,
mestres e doutores.
A forma de realizar este trabalho será
através da recolha e do estudo das seguintes áreas:
a luta pela terra; lutas cívicas e formas de resistência;
o cante e outros formas de musicologia tradicional;
vivência transfronteiriça; a arquitectura popular
e tradicional; arqueologia pré-indústrial (minas
e navegação fluvial); arqueologia versus
turismo cultural; a ferrovia no Alentejo; a hidrologia; ecosistemas
naturais; formas de associativismo - mutualismo; movimentos
artísticos - literatura, desenho, pintura,etc.; poesia
popular; filologia e linguística - dialectos locais
e o humor e o anedótico na tradição popular;
os jogos e o lazer, entre outras.
Num patamar eminentemente académico
ao mais alto nível, aderiram ao projecto, para a constituição
de uma Comissão Científica, com o objectivo
de dar o aval científico ao trabalho a realizar pelos
investigadores, ou outros, aceitaram participar e têm
estado a participar os catedráticos, académicos
e cientistas, entre outros os presentes na sessão de
apresentação na Casa do Alentejo.
Para além da participação
deste vasto leque de investigadores, "actores",
cientistas sociais e docentes universitários propomo-nos
ainda ter a colaboração de autodidactas, activos
na investigação e detentores de espólio
documental nestas áreas.
Com o objectivo de uma intervenção
o mais ampla possível para recolha da memória
através da oralidade e de arquivos públicos
e particulares (pessoais ou de instituições)
não com uma perspectiva elitista, épica ou passadista
da História, mas da participação activa
e permanente do homem anónimo - que como indivíduo
e colectivamente foi decisivo para a História do século
XX não só, mas nomeadamente no Alentejo - onde
não há lugar a branqueamentos e outras subtilezas
- elevando esta História dos sem história ao
papel que de facto protagonizaram no século XX no Alentejo,
porque esta é a verdadeira História viva - com
o devido rigor científico e seriedade intelectual que
se impõe - em oposição a uma historiografia
do politicamente correcto.
O regime democrático e o Alentejo
precisa de não se envergonhar dos seus heróis,
anónimos tantas vezes, que lutaram pela democracia,
pela liberdade e pela felicidade do povo - de que faziam parte,
das lutas, das vitórias mas também das derrotas.
Esta é a História que pode ser também
um instrumento de reflexão para a construção
de um futuro de desenvolvimento harmonioso e sustentado para
o Alentejo. Para que não aconteça a delapidação
da memória colectiva, propomo-nos criar a Hemeroteca
do Alentejo e conjuntamente com todos os investigadores, docentes
universitários e entidades públicas e privadas,
numa perspectiva de total abertura e transparência,
em estreita ligação com as entidades locais
onde o centro se instalar, incentivar e promover - através
de formação a estudantes dos diversos graus
de ensino - o gosto pela memória da sua terra e da
sua região, assim como nos outros concelhos alentejanos.
Para a realização deste projecto
está em funcionamento uma Comissão Instaladora,
entretanto alargada a cerca de 12 elementos que tem vindo
a envidar esforços para contar com o apoio de todas
as entidades alentejanas - CCRA, governos civis, associações
sindicais, núcleos empresariais, associações
de desenvolvimento local e outras - onde as autarquias - e
associações de municípios - terão
papel de relevo, tendo já sido contactado o Presidente
da C. M. de Montemor-o-Novo no sentido de estabelecer cooperação
tendo em conta a existência de um espólio sobre
a Reforma Agrária neste concelho.
A CI do CEDA tem procurado consolidar o projecto,
estabelecendo bases solidas, a fim de permitir um trabalho
permanente e científico nas diversas áreas referidas,
através do estabelecimentos de protocolos com entidades
como autarquias, organismos regionais e nacionaisde candidaturas
a fundos comunitários, de organismos regionais e nacionais,
assim como através de bolsas a entidades vocacionadas
para o apoio à investigação científica
- "Projecto Erasmus" ou "Fundação
para a Ciência e Cultura", Fundação
Gulbenkian, Instituto do Livro e da Leitura, Montepio Geral,
entre outras.
É também intenção
da CI do CEDA a realização de protocolos de
intercâmbio com entidades como o Centro de Documentação
25 de Abril, a Associação 25 de Abril, a Associação
José Afonso, o Centro de Estudos Adriano Correia de
Oliveira, a Fundação Humberto Delgado, o Museu
República e Resistência, ou a Comissão
Nacional da UNESCO, bem como continuar os contactos em curso
com outros investigadores e personalidades várias.
Paralelamente ao trabalho científico
e num espírito de modernidade propõe a CI realizar
diversas actividades de carácter cultural, social e
lúdico, através da realização
de edições, colóquios, debates, espectáculos
de música e poesia, exposições de artesanato,
gastronomia, vinhos, poesia popular, com o objectivo de recuperar
o espirito muito próprio de convivialidade do alentejano.
Entretanto o CEDA tem vindo a organizar Encontros
sazonalmente em co-organização com as Autarquias
Alentejanas foram realizados em Mértola (Fevereiro),
em Barrancos (Maio) e Sines (Setembro) tendo participado cerca
de 300 pessoas onde tem feito recolhas diversas e edita
o Boletim Memória Alentejana com execução
gráfica das Edições Colibri - onde se
publicam, entre outros, artigos que sintetizam as comunicações
dos Encontros, enquanto está em fase de legalização
e de negociação para a instalação
definitiva num concelho alentejano, o que não invalida
a abertura futura de pólos em diversas regiões
do Alentejo, assim como na Casa do Alentejo, onde tem funcionado
a sua sede provisória.
No âmbito de contactos em curso e colaborações
várias por exemplo da Universidade de Évora
foi no passado dia 18 de Junho inaugurada a colecção
"Memória e Escrita Alentejana", uma parceria
das Edições Colibri com o CEDA, com o lançamento
do livro do Prof. António Ventura, O Cerco de Campo
Maior, que contou com a presença do Reitor da Universidade
de Lisboa, Prof. José Barata Moura e da comunidade
científica em peso.
Nos Encontros e na publicação
do Boletim Memória Alentejana, o CEDA contou
já com o apoio de entidades tão diversas como
a Delegação Regional do Ministério da
Cultura, as Edições Colibri, a EDIA, a CCRA,
a AMDBeja, o Governo Civil do Distrito de Beja, a Administração
do Porto de Sines, as autarquias, naturalmente para
além das de Mértola, Barrancos e Sines, também
as de Beja, Alcácer do Sal, Moura, Mourão, as
Regiões de Turismo "Planície Dourada"
e "Costa Azul", a CGD, a Delta Cafés, a CARMIN,
entre outros, assim como os principais jornais e rádios
alentejanos, que tem apoiado através da divulgação
dos Encontros, que não deixaram de ter eco nos órgãos
nacionais (TV, jornais e rádios).
Eduardo M. Raposo
Coordenador da Comissão Instaladora
do CEDA, Historiador
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